segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

In memorian


restarei-me presente
não em corpo ao certo
afônico, fora de foco
num sonho de memórias

será bom ver-te livre
sem tocar-te o sereno
sem sombra de dúvidas
com as sobras de mim

não arrependa-se agora
viva a tua imortalidade
transcreva nossa cólera
vindo a lágrima, chora

diga sim a um bom homem
com status, culto, belo
que te carregue na mala
que ante a tela se cale

releve o que diz o Papa
a morte jamais separará
torna-nos pó, nada mais
fissão é ofício da vida

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Quédese


paixão
sacada
janela
parede






janela
parede




janela
parede




janela
parede



janela
parede


janela
parede

janela
parede
 chão
pedras

 a
  r
   t
    e
     s
perdas
sangue
caixão


A bela e a fera by Chico Buarque on Grooveshark

sábado, 15 de dezembro de 2012

Última



                                            não pense no fim




                                 há um novo começo





entre eu e mim



Bifurcação


agora e além resta o lado oposto
no dicionário secaram os verbetes
esgotaram-se as letras da cartilha
só há tua voz na minha cabeça oca

vejo desesperança em tons de sépia
tua imagem no fotograma se esvaindo
a barba cresce, sono fenece, eu já
não passo mais impune ao teu nome

minta à vontade, beba sem prudência
com sua paciência esfregue o chão
eu sou um roto. se amo, amo direito
nasci com defeito, acho que vou chorar

sofro de analfabestimo sentimental
tenho coração disléxico, disrítmico
pulso em contratempo, finjo como poeta
medito, rogo, pareço valente e não sou


  Vive by Maria Bethânia on Grooveshark

domingo, 9 de dezembro de 2012

Fútil

A máscara é depois do corpo
Omissão é mãe da mentirinha
Que tem irmã desconfiadíssima
Que aparenta ser, mas só parece

Parente, se aparece, é pra esmolar
São daquelas baratas de lixo orgânico
Numa versão piorada, decadente
Falam e cagam na sua privacidade

Futilidade é perfume importado
De um beco qualquer do errejota
Bate no nariz e não nos olhos
Por isso nunca almeje escondê-la

Pão de açúcar, Lapa de ureia
Capa de livro não é conteúdo
Posso mudar, emudecer, mas sou
Ficar calado por vezes é um dom

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Averbação


acontece que eu sou um passional
veias salientes por latejar carinho
mente que pensa muito mais que vive
e então adoece por não saber sentir

por vezes presente, outras insolente
sempre transbordando, nunca derramado
imperfeito confesso, romântico crônico
alérgico ao idealismo dos falsários

apenas a alta madrugada sabe-me bem
poesia não me revela, me eleva, releva
jogo com palavras, jamais com a vida
se convido é convicto, pra convivência

meu equilíbrio é precário, a dor real
ciúme já não é substantivo o bastante
eu sou assim, Dezembro o coletivo de fim
você um pronome de proximidade distante

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Serve dor


agradeço pela nobilíssima consideração
por oferecer-me alto posto na intimidade
'interventor se o coração estiver mal'
sentir-me-ia deveras útil, mas digo não

irrita-me a investidura do cargo público
esta falta do que fazer quando ficares bem
os cortes de verba pra celular e internet
evasivas justificando falha na comunicação

sei, não são parcos os candidatos à vaga
currículos fervem via e-mail, inbox, olás
ordene-os por boa aparência, saldo em conta
estagiários com boa família servem também

quanto a mim sairei de cena feito a morte
súbito, silencioso, definitivo, em fermata
então o capitalismo regenera, dia amanhece
provo amor em concurso, você outro empregado

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

À Deus


olho para o reflexo da lua à pino
no prédio-espelho pedante, frontal
desperto num meio-dia às avessas
eremita da madrugada in Downtown

reabro a loja de ideias noturnas
aos clientes vendo palavras íntimas
sou executivo do mercado de poemas
invisto meus sentimentos, corro riscos

o silêncio dominical remete ao mar
repuxa sua renda à beira da praia
depois vomita a Segunda frenética
onda de delírios, sons e problemas

não durmo, tampouco quero acordar
amparo a foto dela numa das mãos
sobra na outra o café embriagado
por um destilado de milho qualquer

forjo situações num metal precioso
palavras, desejos, anseios, senões
a negativa futura ecoa no presente
põe-me a almejar plenitude divinal

serei um deus a censurar a alvorada
andrógeno, louco, sedutor e egoísta
guardarei tua alma no templo-coração
morará sempre em mim a deusa poetisa

sábado, 10 de novembro de 2012

Em xeque


Negociando comigo não sou do tipo amigo.
Não vendo-me fiado nem poso de fiador,
Não tem preço de banana, nem promoção.
É sem crédito cretino ou boleto bolado,
Debilito no débito, mas pago a mim cada centavo.

Anos de convívio fizeram de mim meu chegado.
Chequei e vi-me prezado, cultivei por mim apreço.
Não sou boneco de venda, sou sem preço, com valor.
Não me empresto, presto ou compro, doo-me.
Doaria-me a ti fosse pra doer na alma ou no bolso.

Acontece que desta vez concedi-me um prazo.
Juro bem jurado que sem moratória ou cartão
Sou do tempo do cheque, passei-me um voador
Tem canto de tico-tico, voo de falcão-peregrino
migração enviesada em bando de andorinha

Pré-datei minha ânsia, pus em xeque a liberdade
Cruzei num canto da folha e os dedos cruzei em figa
Que siga-me a sorte em trinta, sessenta, noventa
Pra no fim dos noves fora, puro ar bater nas ventas
Sem calote, filhote ou dote, sem ventanear a vida.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Anexo


eu acho que tudo é perdido
se esvai a areia da praia
escuto o barulho de ondas
pressinto o tempo fugindo

pro teu presente envelopado
corro e me para o carteiro
ocorre que ando sem freio
fico feliz, mas sem trocado

troco a roupa para me ocupar
decido sair por aí a tua procura
tocam Vivaldi no meu quintal
atraso pois os olhos marejam

recordo a infância sem avô
a adolescência desperdiçada
o adulto niilista e sem nada
aquela menina sem paz ou pai

no dia a quarta-feira arde
baixa o sol, vem o cigarro
whisky, teu perfume passa
meus pés brancos retrilham

descem as escadas descalços
erro a porta de casa, fujo (de quem?)
o zelador chama: "sua revista!"
grito "Bravo!", ele resmunga

volto, piso na bituca em brasa
lembro do Milton de frágil saúde
'sei que nada será como antes'
o amanhã ecoa em toda a casa

quase esqueço do hoje, agora
rogo mau agouro à cidade-àgora
tanta balbúrdia e tu amas baixinho
te vislumbro no Quintana de bolso

só então te chamo, nos reconhecemos
sinto que conosco é sempre assim
nos desencontramos nos encontros
para o reencontrar ser mais intenso

xingamos o mundo em silêncio
choramos a existência sem lágrimas
namoramos sem ciúmes ou beijo
como se trasbordássemos o vazio


Nada será como antes by Milton Nascimento on Grooveshark

domingo, 28 de outubro de 2012

Optométrica


um poema nasce da dor
ecoa do delírio mental
um poema é demência
influência da ausência

um poema não é de paz
advém da luta, da rinha
urge, ofega, bate, afaga
poema não diz, contradiz

bom poema escarra, cospe
expõe vísceras, mau odor
vegeta em leito de UTI
respira só por aparelhos

duvide de um poema feliz
vasculhe bem suas quinas
há de encontrar sujeira
podridão, fauna lúgubre

poema excita, lubrifica
cheira a gozo, é lúbrico
penetra os olhos do corpo
tão fundo da carne tremer

por trás do raso do verso
há um moribundo pedinte
bêbado, agressor, tarado
cão sarnento, sangrado

há um viciado em tintas
cheirador de alfarrábios
fumante de vagas ideias
comedor de pão com nada

esperante do invisível
na rotunda do existir
a emprestar seu fitar
às vistas descoloridas

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Os Smurfs

Clique na imagem para ampliá-la

Quando criança era tão fã destas criaturinhas que a comemoração de meu quinto aniversário teve como tema os próprios. Neste ano fui convidado a conceber um espetáculo onde os azuis criados pelo belga Peyo ganham os palcos com texto, direção, iluminação e canções de minha autoria (as últimas com harmonia, arranjos e gravações de Lui Barbosa e Bernardo Flesch). A estreia ocorrerá no Teatro Pedro Ivo, em novembro, nos dias 17 às 18h e 18 às 15h30min e 18h. Um trabalho que ofereço integralmente à minha filha, a quem chamo carinhosamente na página de dedicatória do texto de Smurf Manuela. 

Trecho da peça: 

[...]

Vovô Smurf – Se este for o céu Smurf, eu só posso ser Smurfeus seu grande bobo!

Papai Smurf (Eufórico) - Vovô Smurf?!!! Como o senhor che.. Mas já faz quase um milênio desde que partiu!! (Para os Smurfs) Venham Smurfs, conheçam o Vovô Smurf! Ele é o Papai Smurf do Papai Smurf!

Gênio – Mas porque o senhor nunca nos disse que tinha um Papai Smurf, Papai Smurf?

Papai Smurf – Bem Gênio, sobre a saudade não se fala; se cala, se sente.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Animália


o teu tesão é de puritana
arisco, enjaulado, tupi
em ameaça de extinção
fingidor na defesa e cio

eu sou visita indiscreta
entro sem chave, abro janela
vento é na cara, pra voo
se saio é porta cerrada

possuo dedos de poeta
mentalidade de músico
palavras de ator barato
sono de pintor cubista

choro tal cantor cubano
ao pedir caipira de rum
brindo: por Cuba libre!
pero perdí la ternura

(mierda!)

meus olhos vadios te esculpem
filmam em plano sequência
tua saída do banho, desnuda
emburrada, cabelo encharcado

deita, jura paixão por mim
mente e como o faz bem
esconde a mensagem do outro
só para me amar inteira, ali

os dois cobertos de orgulho
em guerra enternecida, afônica
estranhos de íntima visita
inimigos cordiais no prazer

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Gela





Sempre bom lembrar: Obra de ficção, indignação e inspiração.

Não que seja a virgem imaculada
Milagreira, santa ou algo parecido
Possui sim qualquer coisa de anjo
Que ampara em sorriso ou assinatura

Maneiras de lady, pensamento à  frente
Ajeita cabelo, batom, firma a postura
Resoluta, combatente, não altera o tom
ao rimar prefeitura, lisura, cura, cultura

Leoa da ilha, mané, catarina, tripeira
Almeja em Desterro a França do Zé Peri
Em tintas azuis, brancas e vermelhas
Sem o "pequeno príncipe" torto daqui

Sim, também joga, opera a máquina
Mas com mãos de avó, cheiro de mãe
Creme, loção, na delicadeza do anseio
Com todo amor de filha, furor de fêmea

Pra lá da ponte rosa não chora, ressente
Reflete, reconhece, se aconchega, dorme
Pouco e no embalo do salgado vento sul
que sopra - em prece - velas bruxuleantes

Não é mais faceira a moça do Rancho
E amanhece a cidade de cabeça quente
Sem chuva de choro, enlutada de sol
Enquanto o amanhã gela; albino, nevado

sábado, 6 de outubro de 2012

Aguadeiro


os calafrios calorosos
sobressaltos em sonhos
olhar em preto e branco
meu riso tritesíssemo

não por fé, nem por febre
minha doença é congênita
sofro de aquarianismo,
ascendências, inacontecências

vírgulas, pontos, reticências
avio-me receitas de jornal
oráculo de tolo que me pesca
pondo-me peixe fora d'água

dentro da salinha de vidro
resta o reflexo na parede
a convivência com a solitude
ânfora por Ganimedes derramada

não sirvo pra mar ou rio
me cabe a ficção zodiacal
estampada no horóscopo
vanguardista, louco, sonhador

traduzo-me no elemento ar
vida aberta, livre, puro
vital, necessário, invisível
pairando sobre tudo e nada

só cesso na dúvida desaguada
na lágrima represada de bicho
nos teus pulmões que carregam
o oxigênio do meu amor sufocado

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

terminal


de tudo resta a impaciência
uma pitada de sal, enxaqueca
lápis de olho atirado na pia
fragrância cítrica incensada

fica o silêncio retumbante
fotografia na mesa de centro
raspas de gelo liquefeitas
falta de ar na madrugada

então a manhã vem chuvosa
com face triste, consonante
relampejam soluços, saudade
garoam lágrimas e suor frio

dedos hesitam frente ao celular
a maldita memória não falha
recobra o número feito mantra
roga-se Alzheimer como praga

que seja depressão de segunda
o dia que devora a humanidade
pensa, caminha, repensa, senta
de tudo resta a impaciência

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

fórmula de máscara


  eu no futuro


     sou mais anti-ontem



  menos presente

domingo, 9 de setembro de 2012

sorte ou morte! / olhos nos olhos




    
grito com gosto


      livre no Ipiranga


no rio o(u)posto!


__________________________________



Sunday no parque

    
          Vasco e Fluminense

          
                      eu e Buarque



sábado, 18 de agosto de 2012

Amor-mor





Onde há morosidade, 
                                             


                                             não há amorosidade.





domingo, 29 de julho de 2012

Sístole e diástole


cochilei na batida do peito
num papo sem jeito e tímido
il cuore me ninou feito mãe
como há muito já não fazia

veio com voz mansa, pé por pé
cantou o tal canto ritmado
das irmãs sístole e diástole
de leve, retomou a intimidade

meu coração me pôs no colo
fez lembrar que ainda ama
tem carinho pra dar e sentir
sem precisar de outro por mim

não é coração macho alfa, não
é mulher segura, sem jogo louco
pressão ou rompantes de silêncio
é peito, seio, suave e feminino

reatemos o amor que vem de berço
eu prometo, não te troco por outro
nem por paixão, nem por doação
até que o marca-passo nos separe

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Tela fria


mais vinho, menos vinho
sempre me encerro em ti
minhas linhas e vinhas
pra tuas idas e vindas

se me aproximo da poesia
é pra suprir tua falta
se me afasto é zoom out
não por medo, pro enredo

na vitrola digital, o som
how can you mend a bronken heart?
dançaria bem colado e macio
na cama quente, no chão frio

já misturo tudo, canção, álcool
sentimento, palavras, ânsia
é bom pra vida, não pra poema
vira declaração, você reclama

pega meu lado bom, conserva
em scotch ou aceto balsamico
leva pra tua vida com outro
tempera com meu amor a salada

por aqui deixo meu fino rastro
minha pegada, sutil e forte
marcaria teu corpo, tua alma
cabelo, boca, dobras, tua obra

deixo sobras na taça, na letra
te deixo em mim sem te atrair
e enquanto esperas o príncipe
viro atração na tua tela fria

Contemporização


não importa o nome ou endereço
apenas o que vejo, penso, sinto
há tempos o peito não explodia
há tempos não mergulhava assim
de bater cabeça na pedra, pois é
és água dura, pedra mole, papel
tesoura, pau, pedra, fim do caminho
tanto bate que fura meu silêncio
vaza sangue, lágrima, suor, berro
você não quer e eu finjo desdém
odeio teu vaivém, te amo pro além
és vinho, tinto seco, muito tânico
não dá sopa, creme, colher de chá
eu adolesço, adoeço, amargo, adoço
vejo foto, tenho um troço, és linda
a mais do mundo, minha, dele, daquele
eles te querem sim, só eu te mereço
estou piegas, non sense, ridículo
(ainda bem, ainda bem, ainda bem)
te levo comigo pra cima e pra baixo
te elevo na falta de ar, no suspiro
há tempos não escrevia tão ofegante
há tempos não morria de amor todo dia
há tempos não vivia de torpor na noite
o tempo que não passa pra te ver, ter
não para se estás, não verte ou inverte
o tempo que não nasceu e é pra sempre
que não rima com nada e versa com tudo
que se esvai e nos carregará separados
você vai no seu tempo, eu no meu te levo
sem mentira, na mente, alma, pele e corpo
até o último dilatar de púpilas a projetar
o curta-metragem da vida não vivida contigo
na sorte da morte indolor, precisa, súbita
o tempo...
se errado no verbo do poema, é problema
se certeiro na morte do poeta é dádiva, auge
sou grato por cumprires teu papel nessa fita
vivendo nos poemas de ausência,
morrendo num cinema de presença
the end

domingo, 1 de julho de 2012

Maria

Taí a minha parceria com a Cathe Juttel. Espero que façamos mais!

Maria
(Cathe Juttel / Mário César)


Maria sempre que puder
flor de terno lembrar
estarei onde for, desde que haja o mar
Pro peito repousar, segurar violão
juro, estarei lá sempre pra te a...


Maria se te beijo no céu
Sou feliz se no chão
Teu corpo me tocar
eu que tanto te quis, eu que já pedi bis
se essa fonte secar, não esqueça Maria
e eu também viro mar


Mesmo que sejas má, te amaria ainda assim
Então deixo tu ir, pra aprender a voltar
andarei ao teu lado feito braço de rio
E se chuva molhar, caso pinte um estio
fique o leito vazio, se o olho chorar rio, 
não esqueça de mim

*Gravação demo feita como pista base para o arranjo a ser gravado pelo Duo em Preto e Branco.

terça-feira, 5 de junho de 2012

4'33'' n°3

                                                                                           









































                                                                                                                     



























































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































                                 .

Cage


Hoje frio, ontem água, agora o gelo
Sou música composta por silêncios
Não estarei nas fotos ou nos vídeos
Na febre, festas, no 1, 2, 3 e... Já?

Tua felicidade grita, muito me irrita
Peço um drink quente, fumo, bebo
No dia clamei por doença ou morte
À noite pretendi voltar ao ventre

Fecho a conta: a minha, sua, outra
Sentes vergonha da minha profissão
Mas não por receber meu dinheiro
Não ligo, não optei, simplesmente é

Todos me respeitam, menos você
"Cala a boca!" Calo. Choras. Vou.
Estás no chão. Meus sapatos também.
A porta encosto, chaveio, disfarço,
Olho pra trás. Houve briga. Já não há.

domingo, 3 de junho de 2012

Emergência


madrugada, poetiso
vai soar Noel Rosa
Shakespeare, Neruda
não é novo, mas falo

sou cópia mal feita
dos poetas antigos
fosse amigo beberia
um gole com Vininha

dividiríamos a conta
sarros, dores e canto
riríamos nosso riso
choraríamos o pranto

uno palavras no hoje
sem parceirinho genial
escrevo pra não morrer
de paixão, raiva, rancor

digito o amor de dote
lado pobre, lado rico
palhaço humilde concluo
não és tu pro meu bico

não sou Rei, engenheiro
executivo, bon vivant
não tenho casaca de grife
uso Zorba e não Cardin

sei que tu aceitarias
de coração um artistinha
um ator que pode tudo
na alegria e na tristeza

acontece que não admito
Princesa sem conforto,
ladrão na Granja do Torto
trocar sussurro por grito

deixa então o amor pra lá
no nível do bem querer
guardo embaixo do colchão
pra mais tarde poder ter

paixão hoje em dia é item
entrou na economia do lar
fiques tu com um novo rico
sem grana eu não posso amar

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Poema de amor


Não sou um poeta de amor
Eu nem quero falar sobre
É o que me sobra, me resta
Poema de amor não presta

Cá pra nós, nem poeta sou
Sou um medroso que grita,
Escreve, é o que me rende
Poema de amor não vende

Me expresso menos que café
Ex-pressão é preço abusivo
Pago em notas de poesia barata
Poema de amor é coisa chata

Hoje uso de bom mau gosto
Minhas rimas ricas faliram
Investi no tal do amor, perdi
Minha herança, rimas pobres

No fim me faltou estética
Deixei o último verso sem
Poema de amor? Poeta, pô?
De amor não, sou dela.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Clichê


tira o riso do rosto
não trago boas novas
minha decisão tomei
decidi sim, pelo não

foi no beat do soul
sob tom néon à noite
choro, vinho, certeza
pelo caminho te deixo

sigo o rumo, vou daqui
nenhum sentimentalismo
caro, barato ou grátis
minto fora, sinto dentro

bagagem eu tenho e levo
viajo curto, sem volta
deixo tudo e nada está
você fica, fria. saio eu.

cabeça quente, pavio curto?
presente! calma é pro céu
se não tiver nuvens negras
eu tenho paz de vulcão

se pago, não quero troco
faço sem esperar retorno
não por bondade, por gosto
por amizade, por supuesto

mas tire o riso do rosto
você não sabe, não quer
sentir, estar, viver, ser
você é quem vira poema
e eu que pareço clichê

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Nota fundamental


          não confunda


amor de primeira com


             tesão de segunda

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Resúmido


o tempo é agora
a reza molhada
lágrimas de vela
lástimas veladas
olhos de parafina
pingam de saudade
pelo raro futuro
pelo amor maduro
por zelo, manias,
manhas de menina

rezo e é infantil
se desprezo, vil
desespero, desfoco
enlouqueço, ameaço
é crime, vara cívil
varo a noite, alumio
sou farol, nota bemol
acidente musical, nó
sustento, subo o tom
sustenido, assustado

na iGreja bocejo, sussurro
que seja! tudo é branco
nada puro, poeira biblíca
hostilizo a hóstia, Hosana
a estas alturas bebo um drink
beijo teu umbigo, subo no altar
se sou amigo, não sou família
se cafajeste, me resto teu par
pai, homem, marido, mulher
sem jogos de armar ou amar

cruz, religo à Deus
penso em santa, anjo
cruzo a ponte pênsil
só pensam em pensão
em nome do pai pro filho
espírito, santo ou porco?
eu te amo. não. te odeio.
não. não sei. te quero.
sincero, amigo, belém,belém
nunca adversário, relembre
amada, ame. amemos. amém.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Canastrice


Você tem certeza de nada
então retém medo de tudo
Camufla na pele segredos
me deixa febril sem sangria

Carrega um escudo no peito
teu jeito é ficar no escuro
Você que nasceu arquipélago
cresceu, empedrou, virou ilha

No fundo é um circo armado
esse teu coração infecundo
Farpado de alarmes e trancas
Arrancado à força do mundo

Se esconde, não banca sentir
Responde com cartas marcadas
Me tira num jogo canastra
Sou Ás e me joga no morto

domingo, 13 de maio de 2012

Banho-maria


No banho a água lava e clarifica
ideias, rostos, gostos, opostos
Unta corpos, torna-os adstringentes
água gelada, corpos ardentes

Nas imersões relaxo e me acho
Na última descobri bens preciosos:
Uma cidade submersa, eu, você
sobre nós um pouco mais e porquê

Minha banheira é espelho d'água
é mágico, revela o cômico-trágico
Banheira, banheirinha minha, nossa,
existe alguém mais grato do que eu?

Por você escafandrista me resgatar
carinhosa do abissal da tristeza
Revelar o peito-baú, arrombar cadeado,
amaciar outra vez o coração ontem pedra

Meu obrigado é te gostar quietinho,
sob a espuma e mesmo que não se consuma
na saboneteira fica o sentimento, terno
eterno pra que outro ensaboe, enxague

Tanta paixão que transborda da tina
rompe a represa, molha a retina
É pathos, de fato, sem patifaria,
o amor que se coze em banho-maria.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Primeiro desmaio


Anoto recados, afazeres e prazeres
Estou desbotado em todos eles
Me noto homem feito. De quê?
Derrotas, bancarrotas e anedotas

Rio sem porquê, não sinto frio
Visto uma couraça terracota
Quero a meninota em gotas
Quero o abraço amarrotado

Saboto obrigações na sexta
Com Oto ensaio no sábado
O feriado é do trabalhador
Eu trabalho bem trabalhado

Não tem garota, ela ou outra
Lembro. Trampará na vacação
Será que trepa com outro?
Desboco, invoco, dou o troco

Boto meu bloco na rua, me toco
Meu bloco de notas virou poema
mais umas notas e faço canção

Me canso, percebo a patologia
Sai no jornal do dia primeiro:
"Homem desmaia e morre: Sofria de poesia."

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Mães e filhos


Os poetas sem mãe são mais felizes
Numa das mãos um tanto de liberdade
noutra um quebranto de dor
Quem sabe, de tudo vazias
mas sempre munidas de poesia

As mães são cruéis censores
Perto, longe, despertas, ressonando
Moldam o pensar dos poetinhas
Bocage decerto não tinha mãe
Bilac que mamãezona teria!

As mãezinhas não fazem por mal
É da essência, instinto puro
Não querem sua cria em apuros
Por isso cuidado poeta
ao insuflar sua estética

Não mate a mamãe de susto
Evite palavrões acadêmicos
nem ouse se dizer marginal
Assim madrecita cai no choro
imagina o filhote no xilindró

Oiticica apanhou de Parangolé
Mainha pôs geni na marginália
e então armou-se a arenga
Arcou com ditadura e cicratizes
Poeta feliz? Que nada!
Cazuza acertou na pedrada:
"Só as mães são felizes"

terça-feira, 24 de abril de 2012

À três


O acaso faz com que essas duas que a sorte sempre separou, se cruzem pela mesma rua olhando-se com a mesma dor.

Chico Buarque de Hollanda


Ando às voltas com as duas novamente. Gosto de ambas, mas não posso afirmar se é recíproco. Poderiam ser irmãs a julgar pelo biótipo – do qual particularmente sou entusiasta – e pela semelhança nos nomes. Uma mais velha, outra mais nova. Fosse assim, Nelson Rodrigues teria um prato cheio conosco. Seríamos a perfeita e real releitura de A serpente nos palcos do hoje em dia. A grande diferença entre as amantes siamesas? Com uma, fato consumado. Com a outra, futuro postergado. Uma é a do copo de boteco, do sarro, desgarro e sacanagem no carro. Outra é da taça de vinho, dos planos, do ‘se eu não me engano’, dúvidas, conquista à duras penas, conversas e chamegos à boca pequena. Carinho é pras duas. Tesão, música e poesia também. Se com uma esvazio, a outra me preenche. E vice-versa, verso e prosa. Se eu minto pra elas? Não preciso. Tudo é extraoficial porém oficioso. Aprendi que paixão quando é muito formal estraga. Ao leitor desavisado não me pinte como um crápula ou machão a moda antiga que faz a pequena indefesa chorar. Não. Mulher hoje em dia não sofre. Pinta a boca, põe uma renda mínima e dá o troco. Acredite, se eu faço às escondidas, as boas moças já fizeram na minha cara, sem cerimônia e me usando de estofado confortável pra deleite com outro malandro. Sim mulheres, eu mereço, esbravejem. Sim homens, elas também merecem, retruquem. Digam o que quiserem, mas pra mim é tudo lindo. Sem cobrança, briga, destempero, arruaça, desconfiança, angústia ou dissabor. Muito pelo contrário, nos saboreamos o suficiente pra saber o quanto é bom. Quando fica chato nos afastamos. Paixão tipo doce. Se comer demais enjoa e engorda, aí dá um tempo, a boca amarga e lembramos como é bom adoçar a vida. Pois é, conosco é assim. O presente é o presente trocado a cada encontro. Sem juras de amor, fidelidade, ‘era uma vez’ ou ‘felizes para sempre’. Outros tempos, bom amigo. Quer amor, sexo, carinho e atenção? “Compartilhe e terás. Curta e seja curtido”. Diz o evangelho de Jobs segundo Zuckerberg. Sobre nós três? Sim, todo doce é perecível e pode ser que as formigas devorem nosso bem querer. Mas não se surpreendam se virem pelas ruas do amanhã três velhotes bem sacanas, convivendo entre diabos e diabetes e checando de hora em hora o nível da glicose de paixão no sangue.




Umas e outras - Chico Buarque

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Hiato


Não há folha em branco, nem alforria.
Há hiato. No vento, no tempo, no ato.
Pontos em sequência, final, reticências.
Ponto. Parágrafo. Pronto. Escrevo-me.

Resumo-me.  Não quero mas tenho.
Vou e venho. Você vai sem vir.
Rasgo a tela. Não há folha, lembra?
Tenho que ir. Mais um pouco? Fico.

Fica comigo? Não. Café? Sem açúcar.
Se crucifica comigo? Sim. Se dói?
Três dias no máximo. É o máximo!
Depois ressuscita, súbito, solene.

Sim, suscita mais texto. Meu pretexto.
Pra quê? Pra crucificar algo mais.
Não dou ponto sem nó, dizia vovó.
Poema é problema. Queria um conto.

Não há tempo. Depois eu conto. Há temporal.
Atemporal? Não. Sangra sim. Logo sara.
Onde? Na têmpora. Fica perto do pensar.
Perto de ti agora. Embora não queira, fui. Sorri.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Não conto


                                                            pronto o conto


      não pergunte o tema


trema e ponto

quarta-feira, 28 de março de 2012

Melô do Millôr



no Méier melou
           
              foi-se milorde Millôr


     não morreu, mudou

Falta


falta
teu gosto de cedo na boca
você se pintar de louca
quebrar umas quantas louças
fazer um bocado de amor

falta
teu tapa que quase me toca
teu beijo pressão que me soca
mais gás na maldita Coca
ás/azar ao jogador

falta
findar a desimportância
desmedir a temperança
morar em nós a constância
dançar dois pra cá pra acalmar

falta
a mão que o berço balança
do "eu sou mulher" a cobrança
ciúme amansar com vingança
mais criancice e brincar

falta
cuidar de qualquer bichano
durar mais do que um ano
e um vacilo freudiano
do fulano encantador

falta
que você mais me admire
que eu também por ti suspire
te fazer chá caso espirre
pra mim a gripe tomar

falta
que por fim você me queira
uma velha goiabeira
pr'um coração eu talhar
aí não falta mais nada
pois paixão arborizada
é como uma longa estrada
que desemboca no mar
molha a boca antes seca
põe um fim na enxaqueca
faz a alma se alentar
presenteia o que era falta
põe melodia na flauta
e um tanto mais de pauta
pro poeminha acabar

terça-feira, 27 de março de 2012

Quando



Quando me acolherás em suas mãos?
Quando tuas mãos de mãe, suaves
em minhas mãos suadas repousarão?

Vez em quando ando, outras tantas paro
Dessa vez é isso, vivo recuando e recuado
Por enquanto no hoje, agora é momento raro
Tiro sarro, mascaro, saro, removo o passado

Passo um café coando o líquido e memórias
Varro a sala da mente e espero sua visita
e quando chegares não repare a salinha simplória
ecoando a falta de móveis pra que tua presença
preencha, precise, precante, presinta.

Sinto-me homem de Leminski, arde a dor elegante
Caminho de lado, por Deus há quanto tempo?
Tropeço em mim mesmo sem te avistar no horizonte do adiante
Enterro a mente no lápis-papel digital como passatempo
Sem métrica, nem ética alfabética, sentindo na prática
Evacuando a área da razão e escoando o coração
Há quando tempo? Acuando o tempo, não.
Me adequando? Até quando?


quinta-feira, 1 de março de 2012

Sentido


Sentido. Meu eu agora.
O lírico, o físico e o metafísico.
Sem sul, sem norte.
À só e à sorte.
Sem rumo, sem sentido.
Ao guarda na caserna: -Sentido!
Minha mão na tua perna: Duplo sentido.
À dúvida materna: Sexto sentido.
À busca eterna: Sentido proibido.
Sem você.
Sem te ter.
Sem ter tido.
Sentido.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Mano a mano (ela)


Minha cara, não é minha cara não ficar cara a cara com você.
Manuscrevo esse grito de amor,
Mano a mano ela vai saber.


Que o amor de um mais um são dois.
Mesmo que a distância, que depois
de um tempo a gente caiba
num prato de feijão com arroz.


Para amenizar choro, consolo. 
Parabenizar, sonoro soro.
Bela cresce que ter dois não dói. 
Um sol só - ai que dó - não são dois sóis


a brilhar  seu brilho mais bonito.
A fiar um fio, um fio a filho.
Apaziguar, ó pai, desaguar
em dito, voz e violão
o amor que a só dedilho.

Música feita em razão dos dois anos da minha pequena Manu. Estamos distantes, mas como disse na canção "Mano a mano ela vai saber". Em outro momento disponibilizo o áudio.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Quando tudo se ajeitar


quando tudo se ajeitar
os pingos da tinteiro nos 'is',
os de chuva em rasas poças,
os cabelos molhados das moças
pintarão em conta-gotas
telas de Mestre Dalí.

quando tudo se ajeitar
na parede alinhados quadros,
relógio de horário ajustado,
tapete 'bem-vindo' no chão.
o pão quente ali da esquina,
no ouvido da menina
da bossa nova o refrão.

quando tudo se ajeitar
ao pôr do Sol eu me achego,
mas não poso de 'teu nego'.
se estás é calmaria.
se não, nem morro de azia.
não complico, implico ou embico.
se demora, toco um Chico
e encho a boca de feijão.

quando tudo se ajeitar
chega de tanta bagunça.
noitada? vai ter sim senhor.
mas ao lado da amada,
do gato batizado 'Fellini',
de vinho, massa fettuccine
cinema, pipoca e cobertor.

quando tudo se ajeitar
é claro que vai ter problema.
de pequeno a grande dilema.
do 'com que roupa eu vou?'
a papo de separação.
tempo frio vai ficar quente,
fofocarão sobre a gente,
brisa mansa é furacão.

quando tudo se ajeitar
se ajeitar bem de verdade,
na casinha então que é nossa
além da já dita bossa
toca jazz, samba e baião.
cada um torce pr'um time,
segunda é dia de regime
pra engordar o coração.

mas se quando tudo se ajeitar
versos na ponta da língua,
discurso pronto e afiado,
pintar você e um namorado
carimbando meu plano com um 'não',
eu não vou fazer alarde.
pego papel e caneta
e escrevo um bilhete à mão.
contendo uma pá de saudade
de um não ser que pra mim foi,
saio eu pela cidade, subo no prédio mais alto
jogo o bilhete no chão.
e quem pegar que se ajeite
que dê um jeito no jeito
de se ajeitar com a tal paixão.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

À Marte (Amar-te)


Alô Marte, eu já não sou daqui.
Mande um resgate, uma nave, spatial me trate.
Terra vermelha, aqui já não é so Blues,
Caçaram o rock e a nova bossa é proibir.

O bom gosto, não é o bastante bom,
é perigoso, gozar pode ser fatal.
O sorriso pode não traduzir mais alegria,
chorar se feliz, amar se odeia a companhia.

Chega pra lá, que eu tô feliz aqui sozinho, eu sou espinho.
Não me toca, é tão normal pro ser-humano, ser desumano.

E afinal, você E.T. tão global, vendo TV,
vê se manda um sinal, chega logo pro mundo acalmar.

Hi Mars, cê anotou o recado da Elis? I really miss.
De lá pra cá, o mundo ainda tá down e a Rita ali.

Segura as pontas, mutante ser,
marciana, cigana, fulana, desencana...
Aqui já não é tão legal ser legal,
alegando Alagados, Trenchtown.,

À Marte (Amar-te) - Mário César

domingo, 8 de janeiro de 2012

Café com leite